quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Acordo assinado representa uma trégua para uma luta que não terminou


Frei Gilvander (ao centro), entusiasta apoiador da nossa greve, foi uma das figuras de destaque da longa luta que os educadores mineiros travaram pelo cumprimento da Lei do Piso. (Foto: Blog da Cris).

Diferentemente de outras batalhas, quando um dos lados consegue impor ao outro uma derrota total ou muito forte, a batalha atual, da nossa heroica greve dos 112 dias, não teve este final. O governo não conseguiu nos destruir, como desejava fazê-lo, mas nós também não conseguimos, ainda, arrancar do governo todos os nossos direitos. Por isso estabeleceu-se uma trégua, uma suspensão do combate mais direto, em forma de greve e outros meios, para a repactuação de novos termos.

Desde o ano passado, o que desejava o governo? Implantar o subsídio para todos e acabar de vez com o plano de carreira e com o antigo sistema de vencimento básico e gratificações. Ante à decisão do STF em reconhecer a constitucionalidade do piso enquanto vencimento básico, em torno de 153 mil educadores, ou mais, decidiram optar pelo o antigo sistema de vencimento básico mais gratificações, abandonando o subsídio.

Qual foi a estratégia do governo para tentar impedir esta fuga do subsídio? Além da intensa propaganda, o governo rebaixou o salário nominal dos que optaram pelo antigo sistema e abriu novamente uma janela, para que estes pudessem retornar para o subsídio. O governo queria fazer parecer que este sistema era mais interessante. O discurso do governo era sempre o mesmo: já pagamos até mais que o piso por meio do subsídio e o sistema de vencimento básico está em extinção.

Publicado o acórdão do STF em agosto e pressionado pela nossa heroica greve, o governo é obrigado a oferecer a proposta de pagamento proporcional do piso. Mas, de forma vergonhosa o faz através de projeto de lei que instituiria, se aprovado fosse, R$ 712,00 de piso na carreira para todos os professores a partir de janeiro de 2012 - isto para todos os professores, com formação em ensino médio ou com especialização, com um dia de serviço ou com 30 anos de estado. O mesmo piso para todos, assassinando de vez o plano de carreira.

O governo já havia passado pelo vexame de ter que se explicar sobre o que dissera antes, que já pagava até mais do que o piso através do subsídio, quando exibimos os nossos contracheques, provando que ganhávamos muito abaixo do que mandava a lei: R$ 369 para o profissional com ensino médio (o pior vencimento básico do país), e R$ 550 para o professor com ensino superior.

No episódio dos R$ 712 para todos, o governo foi novamente exposto ao ridículo, especialmente com as cenas cômicas, se não fossem trágicas, do assessor do líder do governo na ALMG, que declarou:

- Se eu ganhasse R$ 712 eu ia ser servente de pedreiro".

A TV Record transmitiu a cena algumas vezes e as redes sociais da Internet se incumbiram de reproduzi-las para todo o mundo. Ficou evidenciado que o projeto de lei do governo não cumpria a lei do piso, apesar de ter recebido o suspeito aval, tanto do procurador da (in) justiça de Minas, quanto das comissões de (in)constituição e (in)justiça da ALMG. As duas autarquias do governo foram expostas ao ridículo perante a opinião pública.

E para completar o quadro, um desembargador descobre, após 100 dias de greve, que a manutenção da paralisação poderia provocar uma perda irreparável, pois nos "grotões de Minas" as escolas seriam, secundo o magistrado, a única fonte de alimentação de muitas crianças. Eu cheguei a dizer aqui que, após 100 dias sem esta única fonte de alimentação, estas crianças já deveriam estar mortas e tanto o governador quanto o procurador deveriam estar na cadeia por conta destes supostos crimes.

Portanto, a nossa categoria teve uma grande vitória moral perante a população mineira. E isso não é pouco importante, como algumas avaliações apressadas costumam sugerir. Para os que participaram da nossa greve, e não entenderam o sentido dessa vitória política e moral, é preciso que reflitam sobre a substância do movimento criado a partir da nossa luta.

Já para aqueles que não aderiram à greve e ainda trabalharam contra, fazendo o jogo do governo, claro que eles nunca entenderão isso, pois estão espiritualmente ligados a interesses egoísticos, só interessando a eles as vantagens pessoais e imediatas. São filhos da cultura estimulada durante o período da ditadura militar, segundo a qual, o melhor mesmo é levar vantagem pessoal em tudo. Mesmo que para isso fosse necessário prejudicar os colegas de classe.

Mas, apesar dessa importante vitória moral, ética e política da nossa categoria e dos nossos apoiadores sobre o governo e seu esquema de poder, que até então mostrara-se blindado por uma máquina de moer gente, não conseguimos impor uma vitória total. Esta vitória, no caso em questão, ocorreria com a implantação do piso na carreira para todos os educadores de Minas, incluindo os designados e os futuros servidores.

Contudo, se não conseguimos tal vitória nesta batalha, pelo menos deixamos uma avenida aberta para se avançar em direção a esta conquista. O governo, que dizia não negociar com a categoria em greve, foi obrigado a assinar um termo de acordo com o sindicato estando a categoria em greve. Neste termo de acordo, o governo reconhece a existência de dois sistemas remuneratórios - até então, para o governo, só existia o subsídio - que devem ser aprimorados, num espaço temporal entre 2012 e 2015. E para dar continuidade a esta negociação será criada uma comissão tripartite, composta por sindicato, deputados e governo.

O governo sabe que, não tendo conseguido destruir a nossa carreira e o nosso piso - graças à nossa heroica greve de 112 dias, com toda a resistência e ousadas iniciativas tomadas pelos bravos e bravas guerreiros/guerreiras - terá que negociar o pagamento do nosso piso na carreira, tal como manda a lei. A velocidade com que esta implantação do piso se dará dependerá muito da nossa capacidade de negociar, da correlação de força e da nossa preparação para novas batalhas.

Daí o sentido de pausa, de trégua, de recuo estratégico que podemos atribuir à decisão tomada ontem. Claro que o governo, dentro da estratégia dele, vai tentar passar para a sociedade que ele não fez concessões, que vai continuar negociando o que for possível dentro dos limites da LRF, etc. É o discurso pronto para tentar ofuscar a derrota moral de que foi vítima. Além disso, o governo não deseja um novo enfrentamento com a categoria nos próximos anos, e por isso seguramente terá que fazer concessões.

Da nossa parte, devemos aproveitar a trégua para organizar melhor as nossas fileiras, as nossas bases, fortalecer a rede de apoio que construímos durante a greve, aprimorar os combates no campo jurídico, e apresentar propostas que atendam às exigências imediatas e permanentes, considerando, estas, enquanto a implantação definitiva do piso na nossa carreira.

Alguns pontos para nós têm urgência e serão certamente discutidos pela comissão de negociação do sindicato com o governo e os deputados, entre os quais destacamos:

1) pagamento dos dias parados ainda em outubro. Este tema está relacionado à reposição das aulas. Muita gente não quer repor aulas, uma vez efetuado o corte nos salários. Devemos garantir a anistia para quem não deseja repor as aulas e que os substitutos façam tal reposição. Já para aqueles que se disponham a repor, que o governo antecipe o pagamento dos dias cortados ainda em outubro, ou no máximo em duas parcelas, sendo a primeira em outubro.

2) pagamento da gratificação de desempenho, a que erroneamente chamam de 14º salário, ainda em outubro. É importante que o governo libere esta gratificação ainda em outubro, pois quem ficou em greve durante todo o mês de agosto não terá nenhum salário no mês de outubro.

3) o imediato pagamento da diferença salarial entre a remuneração do subsídio e a remuneração de dezembro de 2010. Isso significa devolver a todos os que optaram pelo antigo sistema a redução salarial aplicada ilegalmente pelo governo. Já que o piso será implantado a partir de janeiro de 2012, que essa diferença confiscada pelo governo seja devolvida, ainda que de forma parcelada, entre outubro e dezembro de 2011. Até porque existe no orçamento deste ano previsão de pagamento integral do valor do subsídio para todos os educadores. Não é legal, nem moral, que o governo puna os que optaram pelo antigo sistema com a redução salarial, já que ele próprio se recusou a aplicar o piso no antigo sistema durante o ano de 2011. Então, o mínimo que devemos exigir sobre este tema é que o governo devolva o que nos confiscou. Ou seja: ou ele começa a aplicar o piso retroativo a agosto de 2011, ou devolva a diferença salarial confiscada dos servidores que optaram pelo sistema de vencimento básico.

4) anulação das medidas de exoneração de diretores e vice-diretores em função da nossa greve;

5) que a implantação do piso na carreira, a ocorrer em janeiro de 2012, faça-se com base no novo valor do piso a ser anunciado pelo MEC para 2012;

6) a manutenção dos percentuais da promoção e da progressão na carreira (respectivamente, 22% e 3%);

7) a intocabilidade das gratificações adquiridas pela categoria (quinquênios, biênios, pó de giz, gratificação por pós-graduação, etc.);

8) a inclusão, no edital do concurso, do direito de opção dos novos servidores pelo antigo sistema remuneratório;

9) a abertura, para os designados e demais servidores, do direito de opção pelo antigo sistema de VB;

10) o pagamento do piso já a partir de janeiro de 2012;

11) dar posse aos diretores e vice-diretores eleitos este ano, já em outubro de 2011;

12) nenhuma punição aos colegas que participaram da greve; entre outros pontos que serão levantados e sugeridos aqui no blog pelos nossos visitantes.

Ainda que o governo deseje escalonar o pagamento do piso entre 2012 e 2015, existem elementos para exigirmos o pagamento integral já em 2012, a saber:

a) em 2012 o governo de Minas receberá aporte financeiro extra de R$ 1,2 bilhão de reais da União, como complementação dos recursos do FUNDEB;
b) até lá o acórdão do STF já terá transitado em julgado, estabelecendo o direito irrecorrível e vinculante ao piso, no mínimo a partir daquela data;
c) o governo de Minas poderá, caso comprove não dispor de recursos próprios para pagar o piso, solicitar complementação da União, pois a partir de 2012 ele estará incluído entre os 10 estados mais pobres que terão tal direito, por receber a complementação do FUNDEB.

No mesmo diapasão dos trabalhos da comissão de negociação, devemos nos preparar, na base, formando e fortalecendo nossos NDGs, para pressionar o governo a atender os nossos pleitos. O fantasma da nossa atual greve e de uma futura paralisação, caso o governo não nos atenda, precisa estar presente, rondando todos os poros do cotidiano... dos de baixo, enquanto sujeitos desta ação, mas acima de tudo dos de cima, enquanto alvos da nossa rebeldia.

Sem o nosso piso implantado na carreira, tal como temos direito, o chão de Minas tremerá novamente, quantas vezes se fizerem necessárias.

Fonte: Blog do Euler
Postado por: Nelson Professor

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